FARENHEIT 451 E O PICAPAU AMARELO

 

     451 graus farenheit é a temperatura em que o papel se queima. Aproximadamente 228 graus celsius, a que estamos mais acostumados. É também o título do livro de Ray Bradbury, de 1953. Uma distopia em que os livros e toda forma de escrita são proibidos por um regime totalitário, que prende e manda para reeducação quem for flagrado lendo, e que queima as casas de quem possui muitos livros. A história foi magistralmente filmada em 1966 por Francois Truffaut e refilmada em 2018 por Ramin Bahrani.

Em 1933, vinte anos antes do livro de Bradbury, o regime nazista da Alemanha promoveu a queima de milhares de livros de autores considerados inconvenientes pelo governo de Adolf Hitler, nos mostrando que a realidade pode ser pior do que qualquer ficção distópica. Quase dois milênios antes a Biblioteca de Alexandria foi incendiada e teve destruídas quase 40.000 obras.

Mas, por que evocar esses dois acontecimentos reais e essas obras de ficção?

Na semana passada a imprensa divulgou notícia de que o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, publicou um relatório sob o título “"Retrato do Acervo: A Doutrinação Marxista", onde, segundo Camargo, "Todas as pessoas de bem ficarão chocadas ao descobrir que uma Instituição mantida com o dinheiro dos impostos, sob o pretexto de defender o negro, abriga, protege e louva um conjunto de obras pautadas pela revolução sexual, pela sexualização de crianças, pela bandidolatria e por um amplo material de estudo das revoluções marxistas e das técnicas de guerrilha".

Afirmou o cuidadoso presidente, que promoveria um expurgo, um “livramento” de mais de 50% do acervo da instituição, por não serem de temática negra. Livros de Marx, Engels e Lênin e de outros autores, como Max Weber, Eric Hobsbawn, H. G. Wells, Celso Furtado, Marco Antônio Villa e Carlos Marighella seriam excluídos do acervo da Fundação. Esclareceu que as obras expurgadas não seriam queimadas, como se chegou a afirmar nas redes sociais, mas que serão embaladas com cuidado e aguardarão quem as queira como doação.

O mesmo Sérgio Camargo, é crítico feroz do movimento negro e diz que os negros deveriam priorizar a leitura da obra de Monteiro Lobato, em vez de dar ouvidos a Emicida e Mano Brown. Afirmou, ainda, que se tornou um preto melhor, por ter lido a obra de Monteiro Lobato.

Eu fico me perguntando que preto melhor é esse, que formou seu caráter pela leitura da obra de um escritor confessadamente eugenista, como é o caso de Monteiro Lobato, em cuja obra, incluindo-se a mais famosa, Sítio do Pica-pau Amarelo, há trechos com expressões claramente racistas?

Certamente um preto de “alma branca”, para usar uma expressão bem ao gosto daqueles que dizem não ter preconceito contra gente “de cor”. Um preto que certamente deve ser subserviente às elites brancas e muito agradecido por tudo aquilo que essas mesmas elites brancas lhe permitiram galgar em sua vida. Um verdadeiro Tio Barnabé, sempre sorridente e cordato.

      Esse episódio me fez lembrar de uma frase muito usual no movimento estudantil nos anos 70, que dizia: Quem se curva diante do opressor, mostra o traseiro ao oprimido.

Comentários

  1. Perfeita descrição! Ele deveria ter lido Marx, Lênin e esses tantos outros a quem ele atribui anarquismo. Isso explica, e muito a ignorância desse néscio à frente de uma Instituição como a Palmares, trazendo aquele velho bordão facista de "cidadão de bem". Seguimos com a ignorância e a vergonha alheia.

    ResponderExcluir
  2. O que fazer com um indivíduo que se odeia profundamente justamente por ser ...preto?

    ResponderExcluir
  3. Esse é um racista disfarçado de "preto" .

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog